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04/10/2018

PLANEJAMENTO SUCESSÓRIO NO ÂMBITO DA EMPRESA FAMILIAR

Iniciamos com as palavras de Arnaldo Rizzardo, “Na humanidade nada é eterno, duradouro ou definitivo. É o homem perseguido pelo estigma de sua finitude, que o acompanha em sua consciência e limita os anseios no futuro. Esta a verdade mais concreta, dura e incontestável. Mas a sucessão, de algum modo, tem uma sensação de prolongamento da pessoa, ou de atenuação do sentimento do completo desaparecimento, especialmente quando são realizadas obras que refletem o ser daquele que morre, e que o tornam vivo ou presente nas memórias.”[1]

Pelo estigma da finitude, o patrimônio semeado durante a vida toda será automaticamente transmitido aos herdeiros, bem como as obrigações pecuniárias, limitadas ao montante transmitido. A Legislação pátria já prevê, de forma genérica e abstrata, soluções gerais para a sucessão patrimonial, a herança é deferida como um todo unitário, ainda que existam vários herdeiros.

Planejar a sucessão de uma empresa familiar e a preservação dos bens conquistados ao longo de uma vida não guarda, obrigatoriamente, relação com o encerramento da carreira empresarial dos fundadores da sociedade.

Extremamente delicado é encontrar um denominador comum que concilie os múltiplos interesses envolvidos, a designação de bens para cada herdeiro pode não ser viabilizada e a venda e apuração de valores correspondentes nem sempre é a solução mais acertada, correndo o risco até mesmo de despertar desavenças entre os familiares.

Resta claro que a sucessão significa um período muito delicado na família, vez que engloba assuntos muito sensíveis, em todos os pontos, tais como: relações familiares, patrimônio, dinheiro, morte e, em alguns casos, empresas.

E por falar em empresas, é fato notório que discutir a sucessão empresarial, não é uma tarefa simples e por vários anos foi encarada como um verdadeiro tabu, isso porque representava uma invasão à privacidade do patriarca. Ademais, algumas famílias evitam o debate sobre a sucessão para precaver possíveis desconfortos.

Porém ao optar em não debater a sucessão empresarial, as famílias estão apenas postergando um assunto de ordem natural e certamente, dificultando o processo sucessório.

O planejamento sucessório só tem início a partir da vontade familiar ou do patriarca, a conversa é um artefato fundamental para a conscientização das famílias sobre a importância da elaboração de um plano de transição entre as gerações. Sem dúvida nenhuma, esperar a sucessão natural para a organização patrimonial, quando já existe uma pré-disposição para o conflito familiar, gera uma insegurança para os membros da família e dificulta o trabalho dos advogados. É justamente quando deve imperar o bom convívio nos negócios planejando uma estrutura para receber os herdeiros, garantindo assim uma profícua passagem, no momento oportuno, para a empresa, e, sobretudo, preservando a harmonia familiar.

A Empresa Familiar em sua maioria é identificada pela presença do seu fundador que é muito marcante, sua caraterística é de ser formada por família e administrada pela maioria de seus membros, com o prospecto de ir passando de geração para geração e assim perpetuar os negócios dentro da família.

Os membros trabalham juntos buscando um mesmo objetivo, o sustento da família, a preservação do patrimônio, da estrutura de forma geral e visam lucros para que ela se mantenha no mercado, de forma tranquila e prospera.

No entanto para que a empresa siga seu curso normal deve haver entre os membros da família maturidade, visão ampliada, inteligência emocional, comprometimento, harmonia e bom relacionamento.

Assim, as empresas familiares com o tempo percebem a necessidade de se planejar para essa sucessão, pois como o fundador trabalhou a vida inteira para manter a empresa funcionando, também haverá o momento de parar e passar a gestão para seu sucessor, para que o mesmo dê continuidade a gestão das empresas. Ocorre que, muitas das vezes o sucessor não está preparado, ou não se preparou para esse momento.

Desta forma o planejamento sucessório deve ser analisado pelas empresas familiares, para definir como serão as sucessões futuras, resguardando o patrimônio e dar base sólida para as demais gerações, pois pode correr o risco, não havendo planejamento, de não perdurar a continuação da empresa da família.

O empresário fundador pode pensar no planejamento através de vários instrumentos jurídicos, a partir de um diagnóstico para verificar qual o melhor caminho, e se tem perfil para esse tipo de planejamento. Este processo deve ocorrer de forma paulatina, é necessário planejar passo a passo, sendo observadas as devidas situações e estratégias.

Na empresa familiar o Processo Sucessório, é um rito de passagem muito importante não só para ela, mas também para os familiares, pois será um ato de transição e a continuidade que terá a empresa a partir da nova gestão.

O processo sucessório não é apenas passar o cargo, ocorrem várias mudanças, tem de ser cuidadosa, porque irá mexer com a família e a empresa, com as posturas e modelos. A sucessão não é uma passagem de coroa, mas é necessário que isso aconteça, para que a empresa continue com um formato de gestão e progredindo, será um marco para a empresa e a família.

Para que o planejamento sucessório tenha sucesso é preciso ser discutido e entendido pelos membros da família para ocorrer uma transição suave.

Claro que o processo não será a todo tempo tranquilo, tudo que não é conhecido gera certa insegurança, conflitos e dúvidas, tanto para o sucessor quanto para o sucedido. As mudanças de paradigmas nem sempre são vistas como uma boa ação, existem resistências de várias partes, mas com o passar do tempo e aos poucos vai sendo aceita.

A prática de um planejamento na sucessão envolve não apenas a reestruturação societária e da gestão, mas passa igualmente pelo planejamento da sucessão patrimonial pessoal dos empresários. A combinação de estruturas societárias e de gestão mais modernas, abrangendo Conselhos de Administração e Diretorias Executivas profissionalizadas, Conselhos de Família, programas de formação para os sucessores, realização regular de assembleias, reuniões de sócios, transparência nos números, estruturas societárias distintas para cada ramo de negócio, não esgotam um planejamento sucessório completo para grupos empresariais familiares.

A proteção do patrimônio pessoal, coligada aos anseios do detentor do patrimônio, envolvendo a formação de "holdings" patrimoniais, testamentos, adiantamentos da legítima e outros institutos de ordem civil ou societária, por vezes combinados, complementam o planejamento e possibilitam, inclusive, buscar almejadas economias tributárias. Se a antiga e tradicional "confusão" entre o patrimônio da empresa e o patrimônio do empresário é hoje pecado mortal, o planejamento destinado à perenidade da empresa não passa ao largo da preservação do patrimônio pessoal.

Não se pode falar em sucessão empresarial familiar que foque apenas o negócio. Os percalços de ordem civil, tais como as separações e divórcios, falecimentos, novos casamentos, dívidas pessoais devem ser apreciadas num planejamento que atenda aos interesses e anseios de um empresário.

É claro que, aos ouvidos de alguns empresários a expressão "planejamento sucessório, societário e patrimonial" soa desconfortável. Não é incomum que empresários experientes afrouxem a gravata ou derramem algum suor da testa durante uma reunião destinada a discutir o planejamento da sucessão da empresa familiar e a preservação do patrimônio para as futuras gerações.

Contudo, é importante que se diga: um planejamento sucessório eficiente é elaborado e praticado a médio e longo prazo, quando o empresário ainda goza de sua plena capacidade laborativa, criativa e tem com clareza em mente os pilares e conceitos da empresa a serem conservados e transmitidos a seus sucessores.

Planejar a sucessão de uma empresa familiar e a preservação dos bens conquistados ao longo de uma vida não guarda, obrigatoriamente, relação com o encerramento da carreira empresarial dos fundadores da sociedade.

Ter um bom negócio e trabalhar duro passou a não ser o suficiente para garantir a preservação de uma empresa. A responsabilidade social e ambiental, a profissionalização da gestão e a preparação profissional dos sucessores, a preservação da memória da empresa, a segregação entre o patrimônio pessoal e os bens e recursos da sociedade e, finalmente, a modernização dos instrumentos contratuais societários (contratos sociais, estatutos, acordos de sócios) aliados à adoção de boas práticas de governança corporativa, passaram a ser imperiosos para garantir a continuidade de empresas familiares.

Neste contexto, as empresas familiares hoje cada vez mais estão conversando e vislumbrando as possibilidades de ingressar em um planejamento sucessório, que é um instrumento que traz tranquilidade, organização e uma sucessão construída e planejada de uma forma que seus resultados sejam colhidos pelas futuras gerações.

É necessário sair da inércia. É necessária coragem. É necessário planejar. As empresas, o patrimônio e as futuras gerações agradecem.

 

 

Lucas Quintana

Advogado - OAB/MS 18.216

lucas@rzaadvocacia.com.br

[1] RIZZARDO, Arnaldo. Direito das Sucessões: Lei 10.406, de 10-01-2009. 5ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p.18.

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